domingo, 4 de abril de 2010

A História da Vespa

Durantes alguns anos, trabalhei numa empresa onde, além de outras funções, também tinha a responsabilidade (e o prazer!) de escrever sobre motos e carros, nas revistas que editávamos. Enquanto que numa das revistas (dedicada mais às "Empresas & Negócios), a maioria dos textos por mim escritos eram sobre a industria automóvel e testes a motos e carros, na outra (um Magazine) dedicava-me mais a escrever sobre as marcas, alguns modelos de carros que ficaram famosos e também dos seus criadores.
Sendo assim, resolvi começar a colocar aqui alguns dos muitos textos que escrevi e foram publicados na altura e nada melhor para começar, do que o texto que escrevi sobre a Vespa.

(Não se esqueçam que estes escritos já tem alguns anos e por isso algumas passagens já se podem encontrar desactualizadas, ou faltarem algumas informações sobre o que se passou, desde a altura em que os escrevi, até agora.)

Espero que gostem!


A História da Vespa -
«Tem uma traseira larga, cintura fina e faz um zumbido que lembra uma vespa». Foi com estas palavras que Enrico Piaggio baptizou aquele que viria a ser o meio de transporte usado por milhões de pessoas, verdadeiro símbolo de liberdade e de esperança de uma nação: a Vespa.

Quando se calaram os últimos canhões e deixaram de se ouvir as explosões das bombas largadas pelos aviões das forças aliadas, da bela e gloriosa Itália de outros tempos restava um país em escombros, ferido no corpo e na alma. Para trás ficavam seis longos anos de guerra. O país da «bota» encontrava-se em ruínas e era necessário iniciar de imediato a sua reconstrução.

Localizada em Pontedera, perto de Pisa, a Piaggio -- prestigiada fábrica de produtos aeronáuticos -- encontrava-se parcialmente destruída. Enrico, filho de Rinaldo Piaggio, fundador da empresa, resolveu reabilitar a fábrica; para isso tinha de se produzir algo que fosse útil ao país e que pudesse ser fabricado com a escassa maquinaria existente.
A ideia surgiu-lhe quando percorria alguns dos armazéns que tinham sobrevivido à destruição, que se encontravam pejados de pneus e de pequenos motores, utilizados nos aviões dantes aí fabricados. A Piaggio iria fabricar um pequeno veículo de duas rodas que fosse capaz de suprir a necessidade de locomoção da população! Teria de ser muito robusto, para conseguir sobreviver à quase inexistente rede rodoviária; fácil de conduzir, para puder ser usado por qualquer pessoa; económico, pois os combustíveis além de escassos encontravam-se racionados; e ter um preço de venda ao público acessível a todas as bolsas.

Em 1945 foi apresentado o primeiro projecto, denominado MP5 (que mais tarde seria conhecido por «Paperino», «Pato Donald» em italiano). No entanto, este não seria aprovado por Enrico, pois não apresentava os atributos pretendidos.


A chefia do projecto foi então entregue ao inventor do helicóptero, o famoso engenheiro aeronáutico Corradino D’Ascanio, que fazia parte dos quadros da empresa desde 1934.
O caderno de encargos referia também que o veículo deveria ter um pneu sobresselente e não possuiria corrente de transmissão -- muito difícil de fabricar naquela época.

A 27 de Abril de 1946, no elegante Golf Club de Roma e na presença do General Stone, representante do governo militar aliado, a Vespa foi apresentada ao mundo. Surpreendia pela graciosidade das suas linhas e pela forma como o seu criador tinha conseguido construir um veículo que se demarcava das restantes motos devido às suas características de veículo utilitário, dando início ao conceito «scooter», ainda tão em voga nos dias de hoje.


A aceitação deste novo tipo de moto por parte dos «media» foi imediata. Por exemplo, o «New York Times» dava as boas vindas à Vespa, referindo que era «Um produto completamente italiano, como não víamos desde as quadrigas romanas».

Equipada com um propulsor a dois tempos de 98 cc e 3,2 cv de potência, a Vespa atingia os 60 km/h. Rodas de 8 polegadas (herança dos aviões), carroçaria em metal como os automóveis, motor colocado na traseira junto à roda, selector da caixa de três velocidades colocado no guiador e depósito de combustível debaixo do assento foram algumas das inovações apresentadas.


Uma das principais características da Vespa, pois não se pode chamar «defeito» a algo tão específico e que tem a ver com a própria concepção do veículo (seria o equivalente a afirmar que a típica vibração produzida pelos potentes motores das Harley-Davidson é um «defeito») era a tendência para «fugir» para a direita. Devido à localização do propulsor e também à arquitectura da suspensão dianteira, de um só braço, o peso encontrava-se concentrado no lado direito. A Piaggio tentou de diversas formas minorar esta característica da Vespa, tentando uma melhor distribuição de peso, nomeadamente com a deslocação da bateria e do pneu sobressalente para o lado oposto ao do motor, mas mesmo assim a Vespa padecia de um desequilíbrio. Qualquer pequena ondulação no asfalto e aí tínhamos a Vespa a «abanar», mas nada que o seu condutor não conseguisse -- por pouco experiente que fosse -- controlar, tal era a facilidade com que se conduzia esta «scooter».

Em 1946 foram vendidas 2.480 Vespas e no ano seguinte o número de Vespas comercializadas ultrapassou a dezena de milhar. Entretanto, em 1948 apareceu uma nova Vespa, a 125. Além de um propulsor mais potente (125 cc de cilindrada e 4,7 cv de potência), este novo modelo também sofreu modificações nas suspensões e pequenas alterações estéticas na carroçaria, tornando a Vespa mais atractiva.


A pequena «scooter» italiana, construída essencialmente para servir de meio de transporte prático e económico no período pós-guerra, acompanhou o «boom» económico e nas décadas seguintes transformar-se-ia num símbolo da juventude. Viajar de Vespa tornou-se sinónimo de liberdade e ao mesmo tempo de moda.


Também no cinema a Vespa dava cartas. «Roman Holiday», realizado em 1953 por William Wyler e protagonizado por Gregory Peck e Audrey Hepburn; «La dolce Vita» de Frederico Fellini, com a participação magistral de Marcello Mastroianni e Anita Ekberg; «An American in Paris», realizado por Vincent Minnelli e com Gene Kelly no principal papel; e, mais recentemente, «Quadrophenia» de Franc Roddam, com Sting no papel principal e música dos The Who, ou «Absolute Beginners», com David Bowie, são alguns dos muitos filmes onde a Vespa entrou.




Actores famosos como John Wayne, Charlie Chaplin, Natalie Wood, Henry Fonda e Antony Hopkins eram vistos regularmente a circular pelas ruas de Hollywood ao volante destas pequenas máquinas italianas.

Na área da publicidade a pequena motocicleta italiana também fez carreira. Marcas como «American Express», «Coca-Cola», «Ferrari», «Guerlain», «IBM», «Lexus», «Samsonite» e «Pringles», para só citar algumas, aproveitaram a boa imagem da Vespa, usando-a como suporte para publicitar os seus produtos.

Apesar da proliferação de novos modelos de «scooters», provenientes de vários pontos do globo, a verdade é que tanto a mais antiga Vespa PX (descendente directa do primeiro modelo), como a Vespa ET (nova geração lançada em 1996) são o meio de transporte escolhido por milhares de pessoas para as suas deslocações diárias, continuando a dar largas aos seus desejos de liberdade.



"VESPICES" -

1946 – Apresentação da Vespa e início da sua comercialização.

1948 – Introdução de novo propulsor na Vespa. Além do motor mais potente (125 cc), foram também introduzidas alterações estéticas.

1950 – A Vespa começa a ser fabricada na Alemanha sob licença da «Hoffman-Werke».

1951 – Neste ano uma Vespa 125 muito «especial», atinge os 171 km/h, batendo o recorde mundial de velocidade na classe de 125 cc.

1952 – Os clubes Vespa de Itália, França, Alemanha, Suíça, Holanda e Bélgica reunem-se, dando origem ao «European Vespa Club».

1953 – Enrico Piaggio presenteia o Papa Pio XII com uma Vespa, que por sua vez a oferece a uma povoação missionária do Extremo Oriente.

1956 – É fabricada a milionésima Vespa. O francês Georges Monneret participa no rali Londres –Paris e atravessa o Canal da Mancha numa Vespa modificada para esse efeito.

1962 – A Vespa participa pela sexagésima vez num filme.

1965 – O modelo italiano ultrapassa os três milhões e meio de unidades vendidas.

1978 – Início da comercialização da Vespa PX, equipada com motores de 125, 150 e 200 cc. A PX ainda hoje é produzida, sendo considerada pelos mais acérrimos «vespistas» como sendo a «verdadeira» Vespa.

1988 -  É produzida a Vespa número 10.000.000.

1996 – Nasce a nova geração Vespa: a gama ET, equipada com um propulsor a quatro tempos e 125 cc.

1999 – No mês de Maio começam a ser fabricado os novos motores a quatro tempos L.E.A.D.E.R. (Low Emission Advanced Engine Range), de 125 cc e 150 cc. Neste mesmo ano, mais precisamente a 23 de Setembro, é produzida a Vespa ET número 200.000.

2000 – Após ter estado ausente durante 15 anos – devido ao facto dos seus motores a 2 tempos não cumprirem, na altura, as exigentes normas anti-poluição em vigor—, a Vespa regressa aos EUA. Este retorno às terras do «tio Sam» foi apadrinhado por Sean Ferrer e Cecilia Peck, os filhos de Audrey Hepburn e de Gregory Peck, respectivamente.


(clicar nas imagens para aumentar)

2 comentários:

  1. Há dois anos, estive no Museu da Piaggio em Pontedera, Itália.
    Scooters (e não só) dos mais variados modelos. Tirei dezenas de fotografias (para mais tarde recordar...) entre elas, uma muito parecida com a primeira deste post.

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